Conto de natal

Véspera da véspera de natal. Discussão intensa, inflamada. Raiva salivando pelos poros. Mãe e filho, aos berros. Os rostos deformados pelo ódio. Na casa ao lado, todos bem quietinhos, tentando escutar. E a netinha, com os cachinhos entre os dedos, aos quatro anos, os olhinhos assustados, assistindo sem entender o bate boca cujo motivo era absolutamente fútil. É que conviver, vez que outra, torna-se um suplício. O desfecho, súbito: deu as costas à mãe, entrou no quarto, respirou fundo e, enquanto ela gritava algo que ele não queria ouvir, vup!, toda a força na porta, que bateu mas não fechou. Que estranho, ele pensou. Em seguida, da sala, veio o grito da mãe; choro e desespero. Era a pequena, estirada no chão. Traumatismo craniano.

Até hoje ele não sabe o que fazer com a culpa. Pra dormir, só com a boletinha.

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